quinta-feira, janeiro 26, 2006

Lágrima em forma de flor

A calma da noite tranquiliza-me. Penso no dia cheio que tive, entre consultas, compras, conversas, etc., e uma brisa suave de silêncio afaga o meu rosto. Lembro-me, por instantes longos, de quem tenho saudades. De quem tive saudades. De quem terei saudades.
Quando partir levarei um pequeno molho de gente dentro da minha mão fechada, junto ao coração. São aqueles que me tiveram como filha, a filha que nunca tive (a minha sobrinha), e @s amig@s querid@s. Sei que isto é um cliché, mas todo esse Amor será uma força e uma saudade.
Vejo-me agora na fase adolescente da vida. Quando cortamos com os pais e seguimos o nosso próprio trilho. Só que no meu caso nada disso é/será natural. É um corte abrupto, pois eles não me aceitam, compreendem ou respeitam como mulher transexual que sou. E, agora, que se aproxima cada vez mais o momento de já não poder "disfarçar" de forma alguma, eles viram-me as costas.
Aliás, como acontece com a maioria das mulheres transexuais que conheço. Resta-me o ombro amigo daqueles e daquelas que me amam como amiga, e não olhar para trás. Seguir em frente, sempre com o mesmo amor que sinto pelos meus progenitores, mas vivendo, finalmente, a minha vida.
Estou farta, cansada, de não viver. Preciso de espaço, de emprego, de casa, de praia, de mar, de sorrisos, de beijos na face, de lágrimas de alegria, de tanta, tanta coisa. Está na hora de cortar amarras. Tanto desta relação pais/filha, como deste país tão tristemente pequeno em mentalidades (já para não falar do resto, senão nunca mais saía daqui!).
Acho que finalmente ganhei a coragem suficiente para viver. E não tenham dúvidas que é isso que vou fazer. E vai começar na minha viagem, longa viagem. Para um universo que não conheço, para junto de pessoas que não conheço, para a civilização!
Mas, apesar de tudo, as lágrimas de saudade caem-me como pequenas flores que brotam dos meus olhos...
Lara

1 Comments:

Blogger Unknown said...

Finalmente vejo a Lara a desabrochar. Finalmente ela se liberta das correntes que a prenderam durante anos a fio. Finalmente vai poder viver em pleno a sua vida. Era suposto estar contente e feliz por isso. No entanto, tal como tu, tenho deitado lágrimas de saudade antecipada, de medo do que vem aí sem ter a minha melhor amiga ao meu lado partilhando os bons e maus momentos, de receio por saber que nos momentos em que te sentirás mais em baixo não estarei aí para os partilhar e ajudar-te a superá-los, de felicidade por saber que finalmente a tua vida começa a encarrilar. Assim, ao mesmo tempo que fico feliz, sinto também uma dor imensa, surda e profunda que me vem do meu mais íntimo, avassaladora, imparável que me faz deitar as lágrimas como gotas de chuva... É a vida. Estamos a entrar no ano chinês do cão. O meu ano. E o futuro apresenta-se-me negro. A única luz que sobressai é a tua ida para uma vida melhor. Força kida. Por mais que me doa a alma, vai com força e confiança.
Jinhos

13:11  

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